Rodrigo Della Santina,
autor de Espelho de Prata e O limiar do surto, concedeu uma entrevista
para o Tomo Literário.
Abordamos assuntos como seu contato com a literatura e, mais especificamente com a leitura, o trânsito do escritor entre poesia e prosa, o processo de escrita, o mercado literário para publicações em plataformas como a Amazon e novos projetos. Transitando entre contos, minicontos, crônicas e poesia, Rodrigo tem alguns trabalhos publicados na Amazon e que podem ser conferidos pelos leitores.
Rodrigo também nos
contou sobre suas principais referências e os livros que indicaria aos leitores
do site.
Confira a entrevista.
Como foi o seu contato com a literatura e quando percebeu
que desejava atuar como escritor?
Rodrigo Della Santina: Eu devia ter uns 12
anos. Foi tarde, eu sei, rs, mas não tenho memória de um contato anterior
significativo. Meus pais e minha avó paterna me contavam histórias e creio que
liam algumas. Mas não me lembro. Lembro que uma professora havia pedido a
leitura de alguns livros para trabalho escolar. Na compra, veio junto (não
recordo como, pois não estava na lista dela) “Ivanhoé”, de Walter Scott,
adaptado por Jiro Takahashi, aquele livrinho da Série Reencontro. Adorei essa
história, essa leitura, mais do que as obrigatórias, rs.
Mas a vontade de
escrever mesmo só foi acontecer na faculdade, quando eu tinha uns 19 anos. Ali
comecei a ler diversos autores e quis também ser capaz de criar com as
palavras. Eu estava deixando a área teatral e ingressando na literária. No
passado, eu havia escrito um roteiro para participar de um concurso. Era um
roteiro de ação, gênero que eu assistia um bocado à época, rs. Nas cenas de
luta, minhas descrições eram: “eles lutam”. Só, rs. Se escrevi 10 páginas, foi
muito, rs. Depois, já na faculdade, escrevi um romance que pretendia falar do
amor romântico atravessando o tempo. Ficou ruim, muito ruim, rs. Uma amiga
apontou que eu não havia conseguido passar a sensação de amadurecimento da
personagem. E ela estava certa.
Após isso, lendo
Camões, Pessoa, Bandeira, Drummond, Cruz e Sousa, Cecília, Augusto dos Anjos,
entre outros, passei a me dedicar mais à poesia, focando no soneto, com uma
influência maior de Camões em meus versos. E então, em 2005, publiquei, por
conta, meu primeiro livro de poemas: “Intertrigem”, pela CBJE; e, em 2008, meu
segundo: “O limiar do surto”, pela Scortecci. Aprendi muito nessa época.
Hoje, escrevo não só
poemas, mas também contos e crônicas.
Você tem poemas e contos publicados na Amazon. Além disso,
você também transita por contos e microcontos. Como é para você transitar entre
esses meios, a prosa e a poesia?
Rodrigo Della Santina: Publiquei, inicialmente, um poema intitulado
“Se” (que é uma paráfrase do poema “If” de Rudyard Kipling) e depois um conto
meio filosófico, existencial, de mistério, inspirado por um conto de Oscar
Wilde (“O crime de Lorde Arthur Savile”), sob o título “Os crimes de Jorge
Marco Bonfim. A sonoridade semelhante ou aproximada dos títulos é proposital.
Para dar ao leitor uma pequenina diversão, se possível. Em seguida, lancei um
livro de contos (“Espelho de Prata”) e, após, um conto de suspense e terror (“A
Antiga Canção de Ninar”, que fala sobre a lenda da Cuca, transmudando-a para
uma realidade mais sombria, mais real). Ambos estes incentivados, lidos e
revisados pela Flávia Werneck, do perfil “@fala.werneck”, que é uma ótima
leitora e revisora, com uma visão bastante acurada das Letras.
Então, para mim,
transitar entre prosa e poesia é algo bastante satisfatório. Acredito entender
um pouco mais de poesia que de prosa. Mas com o tempo acho que consegui
melhorar um pouco nesta última. Há quem diga que meus microcontos são melhores
que meus poemas. A Flávia mesmo considera minha prosa mais interessante. Para
mim, a satisfação em criar, em imaginar é o que me estimula. Mais do que isso:
saber que o que escrevi poderia acrescentar algo de valor na vida de alguém.
Como já aconteceu no passado.
Gosto da diversidade,
da pluralidade, de conhecer novos autores, novos estilos e isso me faz querer
experimentar também na minha escrita, tanto no estilo, quanto nos gêneros, além
de manter uma forma mais tradicional, por assim dizer, de escrita.
Como é o seu processo de escrita? Costuma preparar algum
roteiro para as histórias ou tem um processo mais intuitivo de escrever?
Rodrigo Della Santina: Preciso, claro, saber
o que quero dizer e até mesmo onde quero chegar. Não chego a criar um roteiro
todo certinho, com um enredo completo, mas anoto as ideias, por vezes
acompanhadas de frases ou versos, em geral já com o final quase ou todo criado
na mente (mas nem sempre, claro, rs, às vezes vou tecendo a narrativa durante
sua composição), e em seguida passo à escrita. Até porque, durante o escrever,
outras vão surgindo, complementando, acrescentando ou modificando a ideia
original.
Não posso falar por outros. Acredito que cada escritor tenha sua forma de escrever, seu processo, um modo com o qual se sente confortável. Eu descobri que cada texto exige do escritor a forma que quer ser escrito, e mesmo o estilo. Maluquice? Rs. Então, quando sento pra escrever (pois, como afirmei, gosto da pluralidade cultural), tento compreender que tipo de texto vou compor e como ele deve ser feito, incluindo experimentar de vez em quando, se um conto de Natal ou de terror, se infantil ou dramático, se reflexivo, e por aí vai.
E no caso da poesia, como é o seu processo de produção?
Rodrigo Della Santina: O mesmo para prosa e
poesia. A diferença é que na poesia o planejamento é mais rápido por conta da
extensão de um poema.
Como você tem percebido o mercado editorial para leitores
que publicam de forma independente ou usam a Amazon como meio de publicação?
Rodrigo Della Santina: Devo confessar que sou
iniciante nesse mercado, embora eu escreva já faz alguns anos. Mas nesse tempo,
foquei mais em aperfeiçoar a minha escrita, em aprender, em desejar me tornar
um bom escritor, em encontrar minha voz. Não sei se consegui. Sinceramente?
Acho que ainda não. Mas aprendi bastante sobre o ato de escrever. Entretanto,
acabei ficando um pouco fora no mercado editorial. E, por necessidades da vida,
houve um hiato nesse meu escrever, me direcionando para outros caminhos.
No entanto, observo que
para autores (que são ou deveriam ser também leitores) independentes a
caminhada é mais árdua, conquistar leitores é mais trabalhoso, não só por conta
do esforço solitário, que envolve, em muitos casos, a barreira financeira, mas não
acho impossível. Ou ao menos, tenho a esperança de que não seja, rs.
Vejo na Amazon que
muitos têm sucesso. Como por exemplo a Mari Sales, que se tornou a terceira
autora mais lida do Kindle Unlimited. Deu trabalho? Demorou? Sim. Mas…
Então, quero crer que a
Amazon seja uma boa ferramenta para autores independentes. No meu caso, percebo
um retorno pequeno ainda. Mas sou pouco ou nada conhecido. Ainda que venha
notando um leve, talvez levíssimo crescimento de leituras dos meus livros. E
isso é algo positivo. Em verdade, sou péssimo com a divulgação. Preciso
melhorar isso, rs.
Como surgiu a ideia do livro "Intertrigem" e
também a do livro "O limiar do surto"?
Rodrigo Della Santina: “Intertrigem” foi uma vontade de expor o que
eu escrevia ao público. É um livro que reúne poemas de distintas temáticas e
também de gêneros, tendo nele poemas de humor e eróticos (estes sutis)
mesclados aos “tradicionais”. Nele inseri um soneto onde me utilizo, meio
pobremente, do português arcaico. Uma experiência, que eu viria a melhorar em
“O limiar do surto”.
Este, por sua vez, já
foi melhor planejado. E acredito que com poemas melhores também, rs. Nele, teço
uma narrativa, nas seis partes que o compõem, na qual uso a lenda do cisne que
canta uma última vez na hora de sua morte para simbolizar o último canto do
poeta. Era um momento (que depois seria o hiato que mencionei) em que eu estava
desgostoso e pensava em desistir dos versos, da literatura. Então, quis cantar
uma última vez. E assim arranjei “O limiar do surto”.
O que é preciso para contar uma boa história, seja ela
curta ou longa?
Rodrigo Della Santina: Não creio que exista
uma fórmula, uma regra ou mesmo várias. Acho que escrevemos, porque lemos. E
quanto mais lemos, mais aprendemos. E, dessa forma, vamos melhorando como
escritores, vamos achando nossa forma de escrever.
Então, ler seria uma
coisa necessária. Ler prosa e poesia, gêneros diversos (pois se aprende muito
lendo coisas diferentes, mesmo que você não vá escrever todos), ler desde os
mais simples aos mais complexos, dos antigos aos contemporâneos, estrangeiros ou
nacionais. Com isso, vamos ganhando bagagem, referências, conhecimento que
poderemos utilizar em nossas próprias obras. E, mesmo que não as usemos, elas
estarão ali conosco, de alguma forma entranhadas em nossos textos.
Claro que o
conhecimento técnico é necessário. Monet dizia (não recordo as palavras exatas)
que a paleta, o pincel, etc., eram apenas um meio para a arte. O mesmo com a
literatura. A língua é um meio, a técnica é um meio, mas a expressão é interna
e necessita de ferramentas para nascer.
Quais são os escritores ou as escritoras que, de alguma
forma, influenciaram o seu trabalho como escritor?
Rodrigo Della Santina: O primeiro mais
marcante foi Camões. Numa noite, assistindo à Cultura, declamaram o soneto
“Alma minha gentil, que te partiste” e fiquei fascinado. Depois, naturalmente,
outros surgiram: Bandeira, com sua simplicidade profunda; Cruz e Sousa, com seu
estilo simbólico; Casimiro de Abreu, com uma ternura ainda mais simples que
Bandeira; Bruno Tolentino, com um modo diferente de compor. Na prosa, foi
Tchekhov, com sua forma enxuta e precisa de escrever; Jorge Luis Borges, com
seu estilo de sabor livresco; Edgar Allan Poe, com uma escrita elegante;
Fernando Sabino, com suas narrativas jocosas; Rubem Braga, com suas crônicas
singelas, comoventes, tenras.
Claro que não estou nem
perto de ser bom como eles. (Risos).
Que livros você recomendaria aos leitores?
Rodrigo Della Santina: “O beijo e outras
histórias”, Tchekhov; “Dom Casmurro”, Machado; “O nome da rosa”, Umberto Eco;
“Ivanhoé”, Walter Scott; “Itinerário de Pasárgada”, Manuel Bandeira (muitos
conhecimentos técnicos sobre poesia aqui); “Diálogos”, Borges e Sabato; “Eu fui
Vermeer”, Frank Wynne; “Agassi”, uma autobiografia que mostra o crescimento do
tenista; “O sono eterno”, Raymond Chandler; “O planeta dos macacos”, Pierre
Boulle; “A história sem fim”, Michael Ende. Também os contos do Poe e as
crônicas do Rubem Braga.
Tem algum projeto sendo preparado? Pode nos adiantar alguma
novidade?
Rodrigo Della Santina: Em andamento, uma
narrativa infantil que falará sobre carinho e amizade, utilizando os
animaizinhos, domésticos e de rua, como personagens. Nas ideias anotadas, um
conto de terror sobrenatural, parte inspirado no “Drácula” do Stoker, e um
romance policial baseado num jogo de cartas. Espero ser capaz de concluir esse.
O fracasso do primeiro romance me deixa ressabiado, rs.
Você quer deixar algum comentário sobre algo que não
tenhamos abordado ou algum recado para os leitores?
Rodrigo Della Santina: As perguntas foram bem
elaboradas. Agradeço a você, meu caro, por este espaço, pela oportunidade de
falar um pouco sobre mim, sobre a minha escrita, meus livros, pela gentileza em
me ajudar a alcançar mais leitores.
Um recado para eles?
Renovei a minha satisfação em escrever há pouco tempo e isso tem sido uma
grande motivação para mim. Sinto que a literatura é uma forma de me realizar.
Serei bom? Não sei. Gostaria. Mas o bacana seria poder comover e acrescentar
algo a algum de vocês.
Quem sabe ser capaz de
oferecer alívio.
Seja como for, entendo
que buscar aquilo que nos realiza é um caminho para a felicidade. A realidade
às vezes nos bate à porta, precisamos atendê-la. Mas não precisa ser com
cansaço. Pode ser com o entendimento daquilo que é e do que somos.
Descubram e persistam
em ser vocês!
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