Com a aproximação dos quarenta anos, Catarina, uma mulher
bem-sucedida vê suas prioridades serem invertidas quando começa a sentir a
pressão do relógio biológico para ter filhos. Percebendo a implacabilidade do
tempo, ela inicia uma jornada incansável para alcançar seu novo objetivo: ser
mãe. Mas será que seu desejo realmente é genuíno ou ela está sendo levada por
pressão social? Este é um dos primeiros questionamentos que somos levados a
investigar na obra de contos “Caso Fevereiro Dure Pra Sempre” (63
pág.), da escritora Úrsula Zufrieden, publicada pela editora
Paraquedas. Partindo sempre de personagens complexos, muitas vezes solitários e
em busca por conexões que ressignifiquem suas relações com o mundo e com eles
mesmos, a autora vai tecendo uma obra que fala sobre a necessidade de
pertencimento.
Seus personagens estão sempre em uma busca incessante por
algo, do profundo ao mundano. Seja afeto, acolhimento ou como pegar uma onda
perfeita. Úrsula escreve sobre o desejo de pertencimento de seus personagens
como se fosse o seu. “Escrevo o que pulsa, escrevo o que precisa sair, escrevo
o que observo ao andar pelo mundo. Escrevo como psicografia para meus
personagens. Eles habitam em mim e eu escrevo para lhes dizer que sim, que
estou ali”, explica a autora.
Úrsula Zufrieden (lê-se “sufrida”, uma brincadeira com a
palavra brasileira e nomes estrangeiros) é o pseudônimo de Caroline Costa, uma
escritora multifacetada que usa a literatura como ferramenta para exorcizar a
solidão de nunca achar que pertenceu a lugar algum. A autora gosta de ir e vir
ao Brasil. Nascida em Recife (PE), a autora cresceu em João Pessoa (PB) e de lá
explorou o mundo. Atualmente reside em Zurique, na Suíça alemã. A experiência
de já ter vivido em vários lugares ao longo da vida influencia diretamente sua
escrita. O ser nômade e a relação com sua terra natal são temas recorrentes em
seus trabalhos. Não apenas de forma literal, em que os personagens vivem fora
do seu lugar de origem, mas também de forma figurada, como um sentimento universal
de não-pertencimento, de estrangeirismo. Os personagens de Úrsula vivem
entre-mundos. A relação com aquilo que é estrangeiro e com ser um estrangeiro,
além do sentimento de um Brasil distante, são pontos encontrados em várias
narrativas em “Caso Fevereiro Dure Pra Sempre”.
Influenciada por obras como "Grande Sertão:
Veredas" e autores como Valter Hugo Mãe, Clarice Lispector e Juliana
Leite, Úrsula define seu estilo como metafórico, leve e bem-humorado. Em “Caso
Fevereiro Dure Pra Sempre”, estes elementos estão associados a histórias
cotidianas, mas em que o comum se apresenta de forma desconfortável. É
justamente nas estranhezas da vida que as relações vão se estabelecendo com
maior profundidade. Como a história de uma psicóloga brasileira, que mora na
Alemanha, e aos poucos vai se interessando pela vida de seus novos vizinhos no
conto “Reversa” ou em “Amor perene, felicidade provisória” que
acompanha a relação de cumplicidade entre Rauna, uma moradora de rua, e seu
fiel companheiro, chamado Estácio.
A autora também destrincha os diferentes sentimentos que
submergem em situações mundanas, mas ao mesmo tempo, fantásticas. É o exemplo
do dia a dia de um senhor no fim da vida que espera ansioso pela última visita
de uma pessoa querida, em “O Entardecer do Percevejo”, ou a história de uma
pesquisadora que dedica a sua existência em mapear o impacto das mudanças
climáticas na rota de migração das baleias jubarte em “Megaptera novaeanglia”.
A poética do sentir, do viver, do estar presente neste mundo.
Criando universos singulares, “Caso Fevereiro Dure Pra
Sempre” é seu primeiro livro, fruto de dois anos de escrita intensa
que ganhou força durante a pandemia. “A escrita sempre me surpreende porque me
toca muito fundo. ‘Caso Fevereiro Dure Pra Sempre’ é um pontapé no
meu perfeccionismo. Decidi um dia que o livro simplesmente precisava sair do
útero porque estava ficando grande demais para carregar”, conta.
Apesar desta ser a sua primeira obra solo, Úrsula também
idealizou a antologia “Nordeste Aqui Dentro”, escrita por nordestinas e
nordestinos que residem fora do Brasil. Sua relação com a literatura também
conta com a fundação das comunidades de cuidado Mulheres de Mundos e a
comunidade de criativos O Caminho do Artista.
Úrsula Zufrieden / Foto: Fabiana Nunes |
Confira um trecho do livro “Caso Fevereiro Dure Para Sempre” (pág 16):
“Estácio preenchia na íntegra toda a essência do
diferente. Talvez sua função na vida de Rauana fosse a de ser seu anjo, seu
intérprete, seu segurança, seu táxi, sua mobilidade social, sua ressurreição;
uma espécie de super-humano. Rejeitado, sozinho, incompreendido, engasgado,
cheio de precipícios. Era a natureza livre de Estácio que Rauana mais temia.
Sofria por antecedência que ele rompesse a corda e fugisse. De novo por aí. De
novo sem certezas de coisa alguma. Se isso acontecesse, Rauana voltaria ao começo;
seria decerto o golpe final nas mal-aventuradas tentativas de afeto.”
Adquira o livro “Caso Fevereiro Dure Para Sempre” no site da Editora Paraquedas:
https://www.lojadaclara.com.br/caso-fevereiro-dure-pra-sempre-ursula-zufrieden
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