A
escritora Solange
Ocker nasceu e cresceu na vila Armação da Piedade, em
Santa Catarina, composta por famílias pescadoras. À beira do mar, o local foi
primeiro construído por portugueses durante a colonização, mas agora são os
trabalhadores da pesca que vivem ali. Esta comunidade, repleta de história,
tradições e também perdas, foi retratada no livro Não se esqueça de mim!,
escrito pela autora como uma forma de homenagear suas raízes.
Na obra, ela atravessa complexidades presentes na região e que
dialogam com os contextos sociais conhecidos por muitas pessoas, principalmente
mulheres, em todas as regiões do país. "A essência das experiências
vividas aqui, as dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores, a força das
relações familiares e comunitárias, a luta pela sobrevivência e a constante
presença da saudade são temas universais que ressoam com muitas outras
comunidades e realidades no Brasil”, explica.
Além de detalhar o sentimento constante de perda presente nesses
moradores, também retrata a luta das mulheres por se firmarem em uma profissão
majoritariamente exercida por homens. Com uma protagonista responsável por
assumir o comando do lar depois do desaparecimento do marido, a autora
ficcionaliza a experiência feminina que muito conheceu durante a vida na vila.
Leia abaixo a entrevista completa:
No romance “Não se esqueça de mim!”, você retrata não só a vida
e os desafios nas pequenas comunidades pesqueiras, mas também as muitas vidas
perdidas de trabalhadores no mar e as famílias que ficaram com o fardo da
saudade. Por que decidiu abordar esta questão? De que forma esta realidade se
conecta com você?
Solange Ocker: Nasci e cresci nessa comunidade
pesqueira. Desde cedo testemunhei a dureza da vida no mar, mas o que mais
intensificou essa percepção foi ter casado com um pescador. As longas ausências
e o medo constante pairavam sob mim e todos aqueles que esperam seus familiares
em terra firme.
Certa feita, um acidente marcou profundamente nossa comunidade.
Um barco com todos os tripulantes desapareceu. Nenhum deles foram encontrados.
Percebi que, em um lugar pequeno, que vivencia as mesmas expectativas e
rotinas, a dor de uma família é a dor de todos.
A trama da obra se passa em Santa Catarina, na turística cidade
de Governador Celso Ramos – inclusive lugar em que você cresceu com a sua
família. Por que decidiu escrever sobre a vila da Armação da Piedade? Como o
contexto específico da vila consegue se aproximar das realidades de brasileiros
de outras regiões e estados?
Solange Ocker: Escrever sobre a Armação da
Piedade é uma maneira de homenagear minhas raízes e compartilhar a riqueza
cultural desse lugar. A essência das experiências vividas aqui, as dificuldades
enfrentadas pelos trabalhadores, a força das relações familiares e comunitárias,
a luta pela sobrevivência e a constante presença da saudade, são
temas universais que ressoam com muitas outras comunidades e realidades no
Brasil.
De que maneira os temas de empoderamento feminino e assédio
sexual são abordados através das experiências das personagens Amélia e a mãe,
no contexto dos anos 1960 e 70?
Solange Ocker: A mãe de Amélia simboliza uma
geração de mulheres que tiveram menos oportunidades, pois viveram em um tempo
marcado por normas patriarcais rígidas. Mulheres que sofriam em silêncio,
carregando as cicatrizes do assédio e da submissão esperada pela sociedade da
época.
Entretanto, mesmo em meio à opressão silenciosa, as personagens
lutaram com coragem em busca de voz e liberdade. Elas personificam a
resistência e a determinação, reforçando sobre a importância de combater as
injustiças de gênero em todas as suas formas.
A cultura açoriana e os locais emblemáticos de Governador Celso
Ramos, como a Igreja Nossa Senhora da Piedade, estão muito presentes na trama.
Para você, qual a importância de abordar a presença colonizadora portuguesa na
região e como essa herança cultural influencia a identidade dos personagens e a
dinâmica da comunidade no romance?
Solange Ocker: A abordagem da presença
colonizadora portuguesa da herança cultural açoriana é fundamental para
contextualizar a identidade dos personagens e a dinâmica da comunidade. O livro
ressalta essas heranças diretamente na personalidade e nos valores dos personagens.
A fé, a resiliência e a valorização das famílias, por exemplo, são aspectos
centrais que derivam dessa cultura.
Qual a importância da preservação da cultura açoriana para o
país; e como você acha que a literatura contribui para o processo de proteção
dessa memória?
Solange Ocker: A cultura açoriana é uma parte
fundamental da identidade cultural de muitas comunidades no Brasil,
especialmente no litoral sul do país. A literatura tem o poder de documentar e
registrar essa herança e manter viva a história e as tradições que moldaram
essas regiões.
Sobre a autora:
Solange
Ocker é professora e empreendedora, natural de Governador Celso Ramos, cidade
do litoral catarinense. Formada em Língua Portuguesa e Literatura, com
pós-graduação em Literatura Infantojuvenil, mergulha no mercado do livro
com Não se esqueça de
mim!, romance regional que aborda com sensibilidade as vidas
perdidas ao longo das décadas, na atividade pesqueira.
Instagram da autora: @solangeockerr
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