“A literatura, arte, de que mais
gosto é a que me faz pensar. A União das Coreias é um livro todo feito de
pensamento. É um livro que pensa sobre todas as coisas que há. Das intrigas
insignificantes que acontecem em uma firma burocrática à expansão das galáxias.
Não paro de pensar na união das coreias, não paro de pensar em tudo. Não paro
de pensar no amor e estou emocionado.”
André Sant’Anna, escritor, no
blurb do livro
“[...] no lugar de abordar
generalidades, como, por exemplo, o papel da extrema direita no país, o romance
nos aproxima da intimidade mínima do personagem, como quem diz: é nesse lugar,
na sujeira privada de cada um, que se localizam as duas Coreias. É na cabeça
das pessoas perdidas pelas circunstâncias de um país dividido que essas forças
contrárias guerreiam”
Noemi Jaffe, escritora, que
assina a orelha da obra
“A ironia sutil, a narrativa
despretensiosa e inteligente, as construções originais. Não importa sobre o que
ele escreva, a certeza é de que será boa literatura. Um escritor de talento
extraordinário.”
Maria Fernanda Elias Maglio,
escritora, na quarta capa
A união das Coreias é o primeiro romance do escritor Luiz Gustavo
Medeiros (@luizgmedeiros),
publicado pela editora Reformatório e contemplado pelo Fundo de Arte e Cultura
de Goiás em 2023. Trata-se de um romance de duração que segue, por algumas
horas, os labirintos mentais de Paulo Henrique, um homem de trinta e poucos
anos em um emprego monótono na cidade de Goiânia. A obra conta com blurb
assinado pelo escritor André Sant’Anna, orelha com autoria de Noemi Jaffe e
comentário na quarta capa da escritora Maria Fernanda Elias Maglio.
À medida que o fluxo das
reflexões de Paulo passa por temas como o amor, o sexo, a herança
racial e a própria literatura, discussões sobre a urgência política de um país
politicamente rachado, às vésperas das eleições de 2018, são
incorporados ao enredo. No entanto, em vez de se deter nas divergências
ideológicas ou nas circunstâncias políticas do momento, o romance penetra na
intimidade mais recôndita de um personagem assombrado pelo passado familiar
trágico e dividido entre duas mulheres.
O autor carioca, que reside em
Goiânia há mais de duas décadas, é graduado em Ciências Sociais, e mestre e
doutorando na área de Letras. O seu primeiro livro “O corpo útil” foi vencedor
do Prêmio Hugo de Carvalho Ramos de 2020 e publicado em 2021 pela Editora
Patuá.
Uma obra que aborda as
complexidades da vida e seus dilemas morais
A união das Coreias gira em torno do personagem Paulo que, ao
longo de um só dia, às vésperas do primeiro turno das eleições de 2018,
elabora, rememora e se debate com o seu passado enquanto avalia o presente e o
futuro. Diante do momento de crise que o país passava, na iminência da eleição
de um candidato de extrema direita e com seu principal rival preso pelo futuro
ministro desse governo, Paulo também se vê em uma crise pessoal: o seu passado
de negritude volta à tona enquanto ele nos conta sobre sua relação bígama com duas
mulheres.
Diante de um mundo capitalista
voraz, Paulo se vê lidando com tensões que vão além de sua vida particular: ele
está em um emprego tedioso, envolto de conservadorismo, que é um retrato
preciso da situação sócio-política do país do momento. Além disso, a história
de seu passado familiar trágico, de uma vida que ele gostaria de esquecer, faz
parte também de uma herança negra, de experiências racistas que falam de um
contexto que vai se tornando cada vez mais violento para as minorias.
Segundo o autor, o livro busca
traçar um retrato das complexidades da vida e seus dilemas morais, embora temas
como o amor, o sexo, a infidelidade, a política, os abismos sociais, ajudem a
compor o cenário existencial por onde os personagem se movem.
Luiz Gustavo Medeiros / Foto: Ravy Marmor
Revivendo o passado para
compreender o presente
Em A união das Coreias
durante este dia único, tal com em “Ulisses”, de James Joyce, Luiz Gustavo
passeia pelo passado do personagem sem uma cronologia precisa, através de
recortes e fragmentos que se sobrepõem numa relação anacrônica que se assemelha
muito com o fluxo da memória. Na obra, o autor escreve uma narrativa que ora se
debruça sobre seu relacionamento amoroso com duas mulheres muito diferentes
entre si, ora se vê no escritório de seu emprego tendo de ouvir conversas
políticas de uma extrema direita que saía do armário, e ora retorna ao seu
próprio passado mais remoto, responsável por moldar aquilo que ele é
hoje.
“O livro se passa concretamente
em um só dia, mas percorre muitos anos da vida do protagonista, então a
estrutura do livro tenta – com todas as dificuldades – recriar a temporalidade
da consciência, os movimentos do pensamento, cheio de idas e vindas, avanços e
recuos”, aponta o autor, que opta pela não-linearidade e pela terceira pessoa
para criar a complexidade de um labirinto mental do personagem, com todas as
suas digressões e subtextos.
Com uma memória afiada e mordaz,
Paulo não poupa nem a si próprio nem a ninguém, tarefa cumprida pelo autor
quando afirma que tende a gostar de livros que lhe causam alguma perturbação,
que não buscam redenção ou queiram edulcorar o mundo: “Prefiro aqueles livros
que me deixam em dúvida, que expõem contradições, ambiguidades, falhas.”
Através dessa perspectiva
iconoclasta, que remete tanto à narrativa de um Lourenço Mutarelli, por conta
dos seus recortes cinematográficos, mas também aos relatos e monólogos
interiores da geração beat, Luiz Gustavo mergulha também na própria história de
nosso país que vivia um turbilhão de polarização nos bastidores das eleições de
2018.
“Lembro que assisti à apuração
do segundo turno das eleições de 2018 com um amigo, num bar em Goiânia em um
bairro de classe média. Quando saiu que o Bolsonaro venceu, um homem sacou uma
arma e começou a falar algo como: ‘Agora vamos poder meter bala em bandido’.
Pensei em escrever algo baseado naquele episódio porque achava que renderia
boas imagens”, recorda. “Bem mais tarde, me veio à cabeça a frase que abre o
romance depois de escrever um conto que se passa na cidade”, completa o autor.
Refletindo sobre um indivíduo em
específico, A união das Coreias busca justamente a convergência
entre dois pólos: o pessoal e o universal, o íntimo e o político, retratando o
amor como posse, propriedade, mas também como a busca de uma possível
liberdade.
“Tem uma frase do Godard que eu gosto muito. Ele
diz que cultura é a regra e arte é a exceção. Que a cultura, enquanto prática
social, quando consolidada, passa a podar essa prática. Então, o que eu almejo
– reconhecendo a possibilidade de fracassar – é que meu livro quebre a regra,
tenha um caráter mais individual, possa apresentar ao leitor forma, situações e
comportamentos que gerem um estranhamento bom, no sentido de ajudar a expandir
seu horizonte de compaixão, tolerância, respeito e interesse pelo outro”,
completa.
Luiz Gustavo Medeiros / Foto: Ravy Marmor
Escrevendo as fraquezas: a
literatura é um exercício de empatia
As referências literárias de
Luiz Gustavo são diversas e reúnem uma longa lista de autores consagrados,
muitos deles complexos e polêmicos, com literaturas consideradas subversivas
tanto na forma quanto no conteúdo. Dentre eles, estão figuras como Elvira
Vigna, J. M. Coetzee, Cristóvão Tezza, Thomas Bernhard, Jamaica Kincaid,
Antônio Lobo Antunes, João Gilberto Noll, Ali Smith, Dag Solstad, Paulo Scott,
Kenzaburo Oe, Philip Roth, Arnon Grunberg, entre outros.
A união das Coreias é uma nova empreitada para Luiz Gustavo que
encara pela primeira vez o romance, gênero no qual julgava não ser capaz de
escrever. Uma vez escrito, porém, o autor busca uma conexão com os leitores
através de suas fraquezas. Escrever e ler para ele, é sempre um exercício de
empatia, uma forma de se aproximar de outras pessoas, outros mundos. “Acredito
que isso faz com que, pouco a pouco, a gente se torne mais ciente das nossas
fraquezas e virtudes e passe a trabalhá-las melhor”, justifica.
Sobre os projetos futuros, o
autor afirma que já tem uma nova ideia para um romance, mas que precisa antes
acabar sua tese de doutorado.
Adquira “A União das Coreias” no
site da editora:
https://editorareformatorio.lojavirtuolpro.com/a-uniao-das-coreias/p
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