O novo
romance A finitude das coisas (Editora Patuá, 240 páginas), do baiano
Nélio Silzantov, semifinalista do Prêmio Jabuti de 2023 com a obra “Br2466: ou
a pátria que os pariu”, retrata a juventude nos anos 90 em Vitória da Conquista
(BA). A história segue quatro adolescentes envolvidos com drogas, sexo e
rock'n'roll, explorando a contracultura no interior da Bahia. A cidade, longe
da imagem solar de Salvador, é a verdadeira protagonista do romance,
representando um ambiente que acolhe e oprime, refletindo a decadência das
possibilidades afetivas.
Narrado em primeira pessoa por Jeane, a única
garota do grupo, a trama é dividida em três partes e não segue uma ordem
cronológica linear. Nélio utiliza essa estrutura para explicar o presente
através do passado, apresentando personagens complexos e repletos de traumas. O
desenrolar da história prende o leitor, que é levado a refletir sobre o destino
do grupo e a profecia de que dois dos amigos não chegariam à vida adulta,
enquanto outros dois seguiriam caminhos distintos.
Nélio Silzantov é licenciado em Filosofia pela
Universidade Estadual Do Sudoeste Da Bahia (UESB), mestre em Estudos de
Literatura e doutorando em Educação, ambas pela Universidade Federal de São
Carlos (UFSCar). Além de escritor, é também crítico literário e professor.
Conheça um pouco mais sobre a trajetória do
escritor e os bastidores da escrita do seu novo livro na entrevista abaixo.
O que motivou a escrita do livro? Como foi o
processo de escrita?
Se você pudesse resumir os temas centrais do
livro, quais seriam?
Nélio
Silzantov: Questões sociais, relações interpessoais, violência, morte, a
relação Arte-Vida, a condição humana.
Por que
escolher esses temas?
Nélio
Silzantov: São temas que me inquietam desde sempre e costumo problematizar
em minha produção acadêmica e literária, sobretudo a condição humana, a arte e
a finitude da vida. Tenho interesse em outros temas também, mas acredito que
todos perpassam por essas questões apontadas.
O que esse
livro representa para você? Você acredita que a escrita do livro te transformou
de alguma forma?
Nélio
Silzantov: Considero este livro como um dos mais maduros até aqui, sobretudo
porque, em termos estéticos, ele representa uma síntese dos dois anteriores. Em
certa medida, a escrita deste livro solidificou um estilo que vinha
construindo, ou tentando encontrar o que alguns chamam de voz autoral.
Em sua análise, quais as principais mensagens
que podem ser transmitidas pelo livro?
Nélio
Silzantov: Que a vida é um sopro; que poder contar com aqueles que nos amam
sem nenhuma condição é um dos bens mais preciosos; que conhecer a si mesmo não
é uma tarefa fácil, mas é um dever a ser encarado por todos; que a relação
entre arte e vida vai além do mero entretenimento.
Como a
bagagem dos livros anteriores que você escreveu ajudou na construção da obra?
Nélio
Silzantov: A experimentação no uso da linguagem exercida nos trabalhos
anteriores, sobretudo nos contos de BR2466,
permitiram com que eu encontrasse o tom que gostaria de imprimir numa narrativa
repleta de variações nos climas (ou nas atmosferas das cenas), o que exigia uma
constante modulação desse tom e do próprio estilo.
Por que
escolher o gênero adotado? Desde quando escreve dentro do gênero?
Nélio
Silzantov: Apesar de ter iniciado na poesia durante a adolescência, ao longo
do tempo a prosa se tornou o gênero com o qual passei a me identificar e a
encarar com mais dedicação e robustez. Considero a virada do milênio o ponto
decisivo ou o momento em que resolvi exercer a literatura com mais seriedade,
sobretudo a prosa longa (romance).
Quais são
as suas principais influências artísticas e literárias? Quais influenciaram
diretamente a obra?
Nélio
Silzantov: De modo geral, considero que o cinema e a música influenciam
bastante meu modo de ver e compreender as coisas, o que, consequentemente,
acaba influenciando a minha escrita. Já no meio literário, Machado de Assis,
Hermann Hesse, Robert Musil, Joris-Karl Huysmans e Vergílio Ferreira são
grandes influências, assim como Schopenhauer, Hannah Arendt e Adorno são no
campo filosófico. Mas gosto também de observar e estudar bastante o que meus
colegas contemporâneos vêm produzindo, sobretudo o modo ou a forma como eles se
propõem a escrever sobre algo.
Como você
definiria seu estilo de escrita? Que tipo de estrutura você adotou ao escrever
a obra?
Nélio
Silzantov: Trata-se de um estilo híbrido, marcado pela variação entre uma
escrita descritiva, expositiva e crua, e trechos com uma sonoridade que por
vezes se aproxima da prosa poética. Essa hibridez se observa também na forma,
enquanto amálgama entre o romance e o ensaio. O fluxo de consciência, a
intertextualidade, a fragmentação e a ironia são elementos bastante comuns em
minha escrita. Por ser uma narrativa em primeira pessoa e uma revisita ao
passado guiada pela memória, a não linearidade e a fragmentação se tornam
fundamentos estruturantes para compor a narrativa.
Como
começou a escrever?
Nélio
Silzantov: Escrevo desde a adolescência, sem maiores pretensões, mas somente
a partir dos vinte anos comecei a me dedicar com mais afinco na escrita
literária.
Você tem
algum ritual de preparação para a escrita?
Nélio
Silzantov: Não tenho ritual nem meta diária de escrita, mas sempre estou
escrevendo algo, uma frase no bloco de notas do celular ou trechos mais longos
num arquivo do word. Quando me proponho a trabalhar em algum projeto, seja um
romance ou conto, costumo escrever com mais regularidade, primeiramente o que
me vem à cabeça ou ruminei enquanto realizava outras atividades. Somente
depois, durante as releituras é que reescrevo buscando aprimorar a escrita ou
adequá-la de acordo com a intenção e o tom a ser impresso.
Quais são
os seus projetos atuais de escrita? O que vem por aí?
Nélio
Silzantov: Tenho a intenção de escrever o terceiro romance que encerrará
esse projeto que problematiza a minha cidade natal, mas não tenho nada definido
ainda, além do desejo de fazer uma espécie de reparação histórica ou homenagem
a uma conterrânea que considero uma das maiores artistas deste país. Poucas
pessoas a conhecem, e há pouco tempo era praticamente inexistente no lugar onde
nasceu. Como não tenho nada escrito ainda, e não tenho pressa em iniciar e
finalizar esse projeto, estou com as atenções inteiramente voltadas para A
finitude das coisas.
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