Inspirado pela contracultura e
geração mimeógrafo, o escritor Leo Nunes (@leonardocnunes) mergulha nas profundezas da alma humana através
de sua poesia íntima e subversiva no livro "Está
na hora de me tornar um homem sério". Em sua estreia literária pela Editora
Minimalismos, Leo desafia tabus e explora os percalços da vida moderna,
especialmente para um homem gay em um contexto urbano. Nascido em Duque de
Caxias, na Baixada Fluminense, o escritor traz consigo uma bagagem multidisciplinar.
Formou-se em Comunicação Social - Rádio e TV pela UFRJ e trabalha, desde 2010,
em produtoras de TV e Cinema no Rio de Janeiro.
A obra adota um tom confessional
e autoficcional, sendo dividido em três partes. Na primeira, “pequena
trajetória de uma bicha da baixada”, acompanhamos a trajetória de se descobrir
um homem gay e encarar o mundo conservador de uma região pobre da cidade. Na
segunda parte, “a magia está aqui”, o poeta nos apresenta um mundo mais
convulso e complexo, das montanhas-russas ao Bate-Bate, das Maratonas ao
Sambas, a poesia encontra um espaço urbano complexo de se aprender, cuja
aparência é retratada através das entrelinhas da poesia. Por fim, na terceira
parte, “a vida no apartamento 1107”, seguimos com este jovem adulto em seu
pequeno apartamento e fazemos companhia às aventuras íntimas das noites mal
dormidas, dos amores mal passados e das poéticas que atravessam sua vida.
Leia a entrevista abaixo com o
escritor para descobrir mais sobre a obra:
Se pudesse resumir os temas
centrais do seu livro, quais seriam? Por que escolher esses temas?
Leo Nunes: Para mim, os principais temas do livro são
sexualidade, morte, amadurecimento, religião e identidade. Na realidade, não
foram escolhas, foram temas que identifiquei nos poemas e que surgiram
naturalmente ao longo da escrita. Este livro nasceu de um projeto de exploração
pessoal, como estava me propondo a escrever poesia, resolvi resgatar temas e
assuntos que me acompanharam ao longo da adolescência e início da vida adulta.
O que motivou a escrita do
livro? Como foi o processo e quanto tempo você levou para escrever o livro?
Leo Nunes: Comecei o projeto deste livro durante uma oficina
organizada pelo poeta Rafael Zacca. Elaborei um projeto que pudesse resolver
uma questão: eu queria “esgotar” o tema viadagem para dar lugar a outras
pesquisas. Resolvi então aceitar esse tema e tentar explorá-lo ao máximo.
Escrevi o livro ao longo de três semestres de oficina, fui construindo, através
das provocações e exercícios, novos poemas que buscavam formar uma imagem. Com
isso, consegui reunir uma quantidade de textos e, a partir dali, trabalhar em um
conjunto de poemas que funcionasse. Comecei a escrever no meio de 2021 e
terminei em dezembro de 2022, um ano e meio para conseguir elaborar todo o
projeto.
Em sua análise, quais as
principais mensagens que podem ser transmitidas pelo livro?
Leo Nunes: Procurei trabalhar no livro a jornada de um
personagem. Queria poder ler um livro que contasse e trouxesse os desejos e
sabores de um ser muito específico: uma bicha da baixada fluminense que vai
tentar descobrir o mundo.
Quais são as suas principais
influências artísticas e literárias? Quais influenciaram diretamente a obra?
Leo Nunes: Durante minha adolescência fui um consumidor ávido
dos livros da Meg Cabot, eles eram um grande escape e muleta para suportar a
confusão interna da minha sexualidade. Por isso, eu quis, por muito tempo,
seguir a carreira como escritor de livros infantojuvenis e sempre foquei muito
mais nos gêneros prosaicos do que na poesia. Além dela, fui muito marcado pela
Cecília Vasconcellos e pelos livros paradidáticos que lia na escola. Mais
velho, conheci a literatura de Victor Heringer, Cris Lisbôa e Andrea del Fuego,
autores que me impactaram e ainda me instigam. Na poesia, meu interesse de
pesquisa e consumo tem aumentado, estão em minha lista de leitura Ana Martins
Marques, Marília Garcia, Lilian Sais, Rafael Zacca, Angélica Freitas, Pedro
Cassel, Ana Cristina Cesar, Leonardo Gandolfi entre outros nomes. Para além da
poesia, pensando em cinema, minhas grandes influências são Eduardo Coutinho e
Agnès Varda. Durante minha formação acadêmica, me apaixonei pelo documentário
e, talvez, eles sejam os maiores influenciadores do livro.
O que esse livro representa para
você? Você acredita que a escrita do livro te transformou de alguma
forma?
Leo Nunes: Entendo que este livro é também o resultado de um
processo de autoconhecimento. Trabalho nele muitas percepções de sexualidade e
de como isso afetou meu processo de amadurecimento. No livro exploro a persona
Leonardo Nunes, poeta, gay e morador da baixada fluminense. De certa forma,
posso dizer que passei a existir a partir do livro.
Como a bagagem de projetos
anteriores ajudou na construção da obra?
Leo Nunes: Eu trabalhei alguns anos em um livro de contos,
mas hoje percebo que ele não ficou pronto. Talvez um dia eu o reescreva, ou
não, no entanto, entendo que ele contribuiu para o processo de criar pequenas
narrativas. Fora isso, vejo que meu projeto final da faculdade, um curta
documentário, foi um processo importante para a construção de uma voz. Algo que
comecei lá, acabou se aprofundando neste livro.
Por que escolher o gênero
adotado? Desde quando escreve poesia ?
Leo Nunes: A poesia chegou relativamente tarde na minha vida.
Comecei a explorá-la na oficina da Márcia Tiburi em 2017. Desde então fui
procurando outras oficinas para tentar aprender mais. Para mim, sempre foi
difícil escrever poemas ao mesmo tempo que sempre fui muito curioso sobre esse
gênero textual. O que também me motivou foi querer ver na poesia a realidade,
as palavras, os sentimentos de um homem gay nos anos 2020, algo que eu não
conhecia à época.
Como você definiria seu estilo
de escrita? Que tipo de estrutura você adotou ao escrever a obra?
Leo Nunes: Não sei definir um estilo, talvez ainda seja cedo
para conseguir indicar um caminho pessoal. Hoje, diria que escrevo de forma
mais confessional e autoficcional, ao mesmo tempo que procuro elaborar uma
narrativa poética. O livro é dividido em três partes, três atos da vida dessa
personagem que aparece ao longo do livro. Durante o processo de organização,
decidi deixar esses atos em ordem cronológica, justamente para evidenciar o
processo acontecendo para quem for ler o livro na ordem.
Como você escolheu a editora
para a obra?
Leo Nunes: Com o original pronto em fevereiro de 2023 fui à
procura de editoras dispostas a publicar novos autores. Vi uma chamada aberta
da Minimalismos e enviei o livro. Gostei muito da proposta da editora, de focar
em um estreitamento entre autor e leitor, além do cuidado editorial com o
projeto.
Você escreve desde quando? Como
começou a escrever?
Leo Nunes: Acho que antes de escrever veio primeiro o desejo.
Meu interesse pelos livros começou no interesse pelo objeto. Na escola, nas
aulas de literatura, o que mais me atiçava a atenção era saber quais livros
leríamos ao longo do ano, como seriam suas capas, quantas páginas etc. Depois
foi descobrir as histórias contidas em cada um deles, poder navegar por outros
mundos, sair da minha realidade, ler algo além da bíblia. Na quinta ou sexta
série li o livro que mais me marcou: "Nas pernas da mentira", da
Cecília Vasconcellos. Ele foi o divisor, a partir dali eu também queria ser
escritor. Porém, do desejo para a realidade, demorei muito. Sempre escrevi
pelos cantos, sempre tentei começar projetos e processos, mas nunca tinha
conseguido me dedicar de forma concreta. Em 2013 conheci a Go Writers, escola
de escrita criativa da Cris Lisbôa, e passei a frequentar os cursos, ali foi o
momento em que comecei esse percurso de escrita de maneira consciente.
Você tem algum ritual de
preparação para a escrita? Tem alguma meta diária de escrita?
Leo Nunes: Com um trabalho que me toma muito tempo, não
consigo me dedicar 100% do tempo à escrita. Então, escrevo quando posso, quando
dá, onde dá, do jeito que dá. Por muito tempo idealizei o cenário perfeito,
achei que só poderia escrever quando todas as condições estivessem propícias…
Hoje, entendo que é mais importante fazer o possível do que esperar pelo
momento perfeito.
Quais são os seus projetos
atuais de escrita? O que vem por aí?
Leo Nunes: Estou desenvolvendo um projeto para meu segundo
livro de poemas. Dessa vez, focando no corpo, cidade e memória. Quero trazer
minha cidade natal, Duque de Caxias, e trabalhar a tensão do encontro com a
capital, Rio de Janeiro.
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