Vencedor dos Prêmios Literários
da Cidade do Recife, obra híbrida, que mescla conto, poesia e prosa poética,
volta a circular em nova publicação pela Editora Labrador
O resgate à infância, transição
e vida adulta. Esta é a premissa central do livro de prosas poéticas da
escritora pernambucana Márcia Meira Basto (@zvcvnswq), "Amar
elos Vermelhos" (128 pág.). A obra foi originalmente publicada em
2005, como vencedora do Prêmios Literários da Cidade do Recife, na categoria
Ficção, e atualmente está sendo relançada pela Editora Labrador. A autora é
Mestra em Filosofia, tendo pesquisado identidade e alteridade na obra de
Clarice Lispector.
"Amar elos Vermelhos" traz
uma única personagem cuja vida é mapeada a partir das cores amarelo e vermelho,
que também representam os dois capítulos principais do livro. Dessa forma, o
amarelo é atribuído a um senso de inocência, em que a protagonista é
apresentada como Menina e, o vermelho, ao feminino adulto, em que a mesma passa
a se chamar Mulher. "São contos do feminino que almejam salvar o mundo
pela palavra, ao narrar a passagem da meninice para a idade adulta”, descreve a
autora.
O trato impessoal da personagem
sugere a leitura de uma experiência coletiva, abordando experiências que são de
fácil identificação para as mulheres, como a menstruação, a transgressão de
desobedecer aos pais e a paixão madura. Nos textos que compõem o epílogo,
porém, Márcia se coloca, ela própria, como personagem, narrando o processo de
criação da obra.
Embora possa ser encarada como
uma trajetória narrativa de Menina/Mulher, "Amar elos
Vermelhos" não é um romance. Na verdade, cada capítulo é composto
por episódios singelos, separados um do outro. Essa dificuldade em classificar
a obra reflete uma qualidade da escrita de Márcia, que é a sua hibridez.
Ao falar sobre o gênero que
escreve, a autora afirma se identificar com a prosa poética, que une recursos
como metáforas e sinestesia ao texto linear e se faz cada vez mais presente na
literatura contemporânea. O livro também se destaca pelo seu estilo de escrita
fortemente imagético, sensível e experimental, que costuma ser mais associado à
poesia.
Márcia Meira Basto / Foto: Divulgação |
Uma escritora das entrelinhas:
conheça Márcia Meira Basto
Aos 73 anos, a recifense Márcia
Meira Basto dedica a vida apenas à literatura e ao convívio com os netos. Ao
longo de sua vida, ela conta que trilhou por diversos caminhos, tendo atuado
como advogada, procuradora do Estado, astróloga, contadora de histórias,
arte-terapeuta e prestadora de serviços voluntários. Além disso, como já
citado, é Mestra em Filosofia, tendo pesquisado identidade e alteridade na obra
de Clarice Lispector.
Sua história com a escrita se inicia ainda na infância, sendo ela uma criança que gostava de fabular. Mais para frente, esse hábito encontrou chão na literatura. "Nunca me conformei com explicações lineares. Através da palavra encontrei um meio de descobrir minhas múltiplas identidades, pois somos muitos em um só", conta Márcia.
No seu processo criativo, essa
busca se mantém acesa. Para ela, a criação artística é um portal de entrada
para mundos inéditos produzidos por “palavras, imagens, cores, sons, texturas e
movimentos", que não para em definições lineares. Deste modo, ela revela
valorizar "a importância das entrelinhas, do não-dito", descrevendo
sua escrita como "visceral". Suas principais referências são os
escritores Clarice Lispector, Haruki Murakami, Milan Kundera, Herman Hesse,
Annie Ernaux, Manoel de Barros e Gaston Bachelard.
Márcia é autora de nove livros,
dentre eles o ensaio "Clarice, Clarear o leitor de si mesmo em Clarice
Lispector" (Ed. Bagaço, 1995.), a novela "Marion" (1999) e os
premiados "Desejos e Histórias" (1998) e "Amar elos Vermelhos"
(2005), que venceram os Prêmios Literários da Cidade do Recife. Ela afirma que
o seu objetivo como escritora é "fazer com que os leitores ao reescreverem
o livro, através da leitura, possam ampliar o autoconhecimento e a cosmovisão".
Sua história com a escrita se inicia ainda na infância, sendo ela uma criança que gostava de fabular. Mais para frente, esse hábito encontrou chão na literatura. "Nunca me conformei com explicações lineares. Através da palavra encontrei um meio de descobrir minhas múltiplas identidades, pois somos muitos em um só", conta Márcia.
Confira um trecho do conto
"Amarelos", do livro “Amar elos e Vermelhos”:
"Amarelos irradiando a
alegria da infância. Reluzindo no olhar da Menina. Espalhando-se pelos campos
onde sonhos serão construídos.
Amarelos dos girassóis ardentes de Van Gogh ladeando os caminhos a serem percorridos. Amarelos das auroras plenas de luz, dos despertares para a magia de cada dia. Onde a Menina, frente a um riacho com mangueiras e árvores floridas, adivinhará um futuro ensolarado. Escutará a sinfonia de pássaros cantando os amarelos da liberdade de um voo.
Amarelos dos contentamentos pelas lambidas de beijo do seu cachorro. Das brincadeiras de amarelinha, pega-pega, queimada, esconde-esconde e tantas outras inventadas a partir das coisas desimportantes. Da desco- berta dos sapos transformados em príncipes.”
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