Anna Katharine Green é considerada a mãe do
romance policial. Ainda que você não tenha ouvido falar dela, certamente você
conhece muitos elementos que hoje estão presentes em livros, séries e filmes de
suspense e que advém da obra da escritora. Veja-se como exemplo, o uso de
técnicas forenses de investigação, a presença de um detetive que retorna em
outras obras (como Sherlock Holmes e Hercule Poirot que fazem aparições em
diversos livros de seus autores) e a existência de um personagem que rivaliza a
investigação dos casos com o investigador principal.
Por falar em Sherlock Holmes e Hercule
Poirot, dois grandes detetives escritos por dois grandes autores, temos que
mencionar que a Rainha do Crime, Agatha Christie, tinha inspiração em Anna
Katharine Green, tanto que a cita em sua autobiografia. Bem como Arthur Conan
Doyle também nutria admiração pela escritora americana que nasceu em 1846 em
Nova York.
O Crime da Quinta Avenida tem sua primeira
edição brasileira publicada pela Monomito Editorial, com tradução da escritora
Cláudia Lemes. O livro tinha apenas uma tradução em língua portuguesa realizada
por Fernando Pessoa. Por meio de um projeto de financiamento coletivo, Cláudia
Lemes, que também preside a ABERST - Associação Brasileira dos Escritores de
Romance Policial, Suspense e Terror, em parceria com a Monomito, trouxe ao
público brasileiro a obra de Anna Katharine Green.
Antes de falarmos sobre o conteúdo, vale
destacar o projeto gráfico da obra. A capa, a diagramação, as separações de
capítulos e elementos que estão na parte interna, tem forte ligação com a
história e tornam a jornada do leitor ainda mais agradável.
O livro começa com uma cena que coloca o
leitor dentro do caso, com o clima de suspense e mistério que permeia toda a
história. Numa firma chamada “Veeley,
Carr & Raymond – Advogados e Conselheiros de Direito”, chega um homem
esbaforido, procurando pelo sócio do escritório, Sr. Veeley. Como este
último está em viagem ele acaba por relatar ao interlocutor sobre a morte do
Sr. Leavenworth, um antigo cliente da firma e amigo pessoal de Veeley, e
comenta que, face ao crime, as duas sobrinhas da vítima serão interrogadas e
precisam que alguém as acompanhe. Nesse plano inicial, que está nas primeiras
páginas do livro, ficamos sabendo ainda que a arma do crime não foi encontrada
e que ele, portanto, teria sido vitimado por um tiro.
“_Tudo que sei? Algumas palavras bastarão. Eu o deixei
ontem à noite sentado como de costume à sua mesa na biblioteca, e o encontrei
hoje pela manhã, sentado no mesmo lugar, quase na mesma posição, mas com um
buraco na cabeça do tamanho da ponta do meu dedinho.”
As investigações acerca do crime se
desenrolam, e entra em cena o detetive Sr. Benezer Gryce que terá como auxiliar,
acompanhando a investigação, o Sr. Raymond. Sr. Harwell foi quem anunciou a ele
a ocorrência do crime na cena inicial da obra.
Uma chave quebrada, o sumiço de um papel, o
desaparecimento de uma criada no dia que precedeu o assassinato na residência
localizada na Quinta Avenida e um lenço, se tornam pistas para a investigação e
o desenrolar da trama. Mas não somente isso, outros aparatos serão
inseridos ao longo do processo investigativo.
Em que pese o fato de o livro ter sido
escrito há tanto tempo, vez que sua publicação original é datada de 1878, sob o
título The Leavenworth Case, a narrativa
se faz atemporal. Anna Katharine Green conta uma excelente história, repleta de
personagens com personalidades diferentes e que apresentam uma trajetória
instigante, além de trazer ao plano central da obra uma série de suspeitas que
nos faz ter uma infinidade de interpretações e possibilidades de resolução do
caso.
A narrativa é ágil e não paira em camadas que
não acrescentam à trama principal, o que deixa o leitor totalmente focado na
busca pela solução do crime. Então, desde a primeira página o mistério é posto
e vamos persegui-lo ao longo das 388 páginas da publicação. Não sem antes
duvidarmos dos personagens, ficarmos intrigados com suas ações, buscarmos ler
nas entrelinhas os acontecimentos e aquilo que eles falam nos diálogos que
travam com outros personagens.
Ana Katharine Green surpreende com uma
obra repleta de mistério e que não deixa de tratar da natureza humana. Os
personagens tem sentimentos e guardam segredos tal qual qualquer ser humano e
isso, dentro da trama policial, se torna um viés interessante para que possamos
fazer a leitura da personalidade com que cada figura se apresenta a nós.
Mary Leavenworth e Eleanore Leavenworth são
primas e foram criadas por Horatio Leavenworth. Sobre elas, naturalmente, podem
recair suspeitas. Temos ainda o assistente do homem, Sr. Trueman Harwell, que
notificou sua morte, além de Hannah Chester, uma empregada da casa que fugiu na
noite do crime. Na casa também habitam Thomas Dougherty, o modormo, Kate que é cozinheira e Molly, a arrumadeira.
Temos na trama ainda a menção ao Sr. Veeley, o amigo do Sr. Leavenworth que não
está na cidade e outros personagens surgem, tais como Henry Clavering e Sra.
Belden, para compor o emaranhado de relações e acontecimentos que podem ou não
ter conexão com o assassinato.
“Por mais eloquente que seja a morte, mesmo nos rostos
daqueles desconhecidos e não amados por nós, as causas e consequências desta
eram importantes demais para permitir que a mente se detivesse na tristeza da
cena em si.”
A trama é rica em detalhes que nos levam a
conjecturar explicações para o caso, levantar suspeitos e imaginar inúmeras
motivações. Green, pelo que é possível perceber nesse livro, foca sua trama nos
acontecimentos e nos personagens, mais do que em descrições de cenários e
ambientes (a não ser que seja imprescindível e apareça como elemento
elucidativo). Aí está a riqueza e preciosismo com que opera o mistério em sua
obra. Para além de lermos um excelente livro de literatura policial, que tem
seu mérito por ser escrito por aquela que é considerada a mãe da literatura
desse gênero, temos aqui uma aula de escrita, de enredo e de personagens.
Temos que agradecer à Monomito Editorial e à Cláudia
Lemes por ter trazido essa obra para o Brasil. Fãs de Agatha Christie e Arthur
Conan Doyle, aqui está uma escritora para vocês conhecerem (caso não conheçam)
e lerem (caso não tenham lido).
O Crime da Quinta Avenida é um livro que não
pode faltar na estante de um amante da literatura policial.
Sobre a autora:
Anna Katharine Green | Foto: Reprodução |
Ana Katharine Green (1846 –
1935) foi uma romancista e poeta nascida em Nova York. Ela se destacou por
criar histórias com tramas envolventes. Seu principal detetive foi Sr. Gryce,
mas ela também foi a mãe de outros personagens investigadores com perfis
peculiares, como senhoras solteiras ou jovens garotas com vida dupla. Anna
Katharine Green assinou mais de sessenta histórias e ficou conhecida como a mãe
dos romances policiais.
Ficha
Técnica
Título: O Crime da Quinta
Avenida
Escritor: Anna Katharine Green
Tradutora: Cláudia Lemes
Editora: Monomito Editorial
Edição: 1ª
Número
de Páginas:
388
ISBN: 978-85-907522-3-3
Ano: 2019
Assunto: Literatura americana
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