“Eu queria aproveitar a vida, a minha mocidade, o que eu tinha de bonito.
Queria que as emoções passassem todas por mim antes de me dedicar a escrever,
com o afinco desesperado com que depois me dediquei.”
Eu e Não Outra – A Vida Intensa de Hilda Hilst é a primeira biografia
sobre a escritora e poetisa. O livro foi publicado pela Editora Tordesilhas em
2018 e tem autoria de Laura Folgueira e Luisa Destri, ambas pesquisadoras que
tiveram Hilda como tema antes de publicar o livro.
Quem já leu algo de Hilda Hilst, em algum momento, deve ter se sentido
compelido a querer saber mais sobre a escritora. Pelo menos comigo foi assim.
Em seus poemas, algo faz com que sua imagem seja manifestada, parece que tudo
transparece e aí sentimo-nos motivados a querer saber mais sobre a vida da mulher
que escreveu aquelas palavras.
A biografia nos dá uma visão ampla sobre a vida dessa mulher e delineia
seus traços de personalidade, que se firmam em cada ação contada, em cada
história relatada na obra, em cada depoimento que foi colhido pelas autoras
para formar a pesquisa que culminou na publicação. Vamos da sua infância em Jaú
ao seu falecimento na cidade de Campinas.
Hilda Hilst nasceu em 21 de abril de 1930. Foi filha única do casal
Bedecilda e Apolônio, mas tinha um irmão oriundo do primeiro casamento de sua
mãe com Franklin Cardoso. O irmão chamava-se Ruy. De uma família com posses e
que transitava na alta sociedade paulistana, Hilda chegou a frequentar colégio
de freiras, flertando com a possibilidade de seguir a vida religiosa (dizia às
freiras/professoras que queria ser santa, embora roubasse vinho). Naturalmente,
não era tida como uma aluna exemplar e, mais tarde, chegou a cursar Direito na
Faculdade do Largo São Francisco – em São Paulo.
Sua vida, no entanto, desde pequena, apontava a sua veia literária.
Literatura, diga-se, era um de seus assuntos prediletos com amigos e também se
transformava numa “arma” (grifo meu) que utilizava na universidade para se ver
livre do assédio dos rapazes. Quando algum deles se aproximava e não lhe
interessava, ela lançava uma pergunta sobre a obra de Kafka. Uma mulher de
traços elegantes e belos, com uma personalidade marcante, era tão assediada
quanto assediava. Na obra temos histórias sobre seus namoros e romances, bem
como sua juventude de boemia.
A mulher por trás da figura de escritora se confunde com a própria. Não
dá para dividir Hilda em duas – a que escreve e a que viveu suas
particularidades. Elas estão interligadas por tudo que Hilda vivenciou e pela
forma com que lidou com sua carreira e com sua vida privada.
Como todo escritor, Hilda queria ser lida. Queria fazer sucesso e, por
vezes, não se conformava com o fato de que alguns autores tinham mais projeção,
embora escrevessem coisas sem profundidade, na visão dela. Achava sua obra
grandiosa e merecedora de destaque. No entanto, nem sempre foi assim e, para
exemplo de muitos escritores, Hilda passou por inúmeros percalços, incluindo os
problemas financeiros.
Sua decisão de escrever livros pornográficos veio como objetivo de tomar
certa fatia do mercado editorial e ganhar projeção. Mas isso não fez com que
ela permanecesse apenas em tal gênero. Escreveu romances, textos teatrais e até
livro infantil.
Hilda Hilst era uma mulher ousada, elegante, cheia de excentricidades e
carregada de amor. Ela traz a dualidade da personalidade extremamente a frente
de seu tempo, corajosa e liberada das amarras sociais, mas também aponta um
lado profundamente afetuoso e que valoriza o companheirismo em suas relações.
Estava sempre cercada de amigos.
“Estou convencida de que
o amor é a única coisa a se viver. Minha infraestrutura é completamente
amorosa.”
Em Eu e Não Outra não há debate, discussão ou dissertação sobre a obra
produzida por Hilda Hilst. Está sim demonstrada a trajetória de vida da autora,
que por vezes esbarra na literatura, apresentada como um fato relevante dentre
as passagens importantes da vida de Hilda.
Foi em 1950 que começou a notoriedade de sua produção poética e, quase
quarenta anos depois, resolveu publicar sua tetralogia obscena, composta pelos
livros O Caderno Rosa de Lori Lamby, Contos de Escárnio – Textos Grotescos,
Cartas de um Sedutor e Bufólicas (uma coletânea de poemas).
A escritora/poetisa viveu muito tempo na propriedade chamada Casa do Sol,
localizada em Campinas, no interior de São Paulo. Na casa produzia seus textos,
estudava, pesquisava. Estava imbuída e motivada em buscar conhecimento sozinha.
Aos trinta e um anos abriu mão da vida de glamour
que levava na capital paulista para se manter concentrada na produção de
sua obra. Grande parte de seus textos foram produzidos na Casa do Sol, que hoje
abriga o Instituto Hilda Hilst.
Ali também fazia seus experimentos, como tentar contato com os mortos por
meio de frequências de rádio. Sua ligação com o misticismo já vinha da
infância, mas a autora começou a receber sinais que levaram-na a acreditar serem sobrenaturais e evidências de
que havia vida após a morte, ou então vida extraterrena.
“Hilda levava tão à sério
as tentativas de captar vozes que, quando tinha êxito, anotava as frases em seu
diário, identificando-as por horário, fita, lado e marcação do contador.”
As reuniões com os amigos eram bastante frequentes, não importando o
horário do dia. Jovens estudantes se aproximaram da escritora e se tornaram
amigos caros. Foram até a Casa do Sol em busca de conhecer mais sobre a obra e
a autora. Na Casa do Sol passou pelo regime militar, sem sofrer perseguição. A propriedade,
inclusive, serviu de abrigo a um amigo perseguido pelos militares.
Ela teve contato com muita gente bastante conhecida. Foi amiga de Caio
Fernando Abreu e Lygia Fagundes Telles, por exemplo. Lecionou na Unicamp,
passou por altos e baixos no meio editorial, mas manteve-se firme em seu
propósito de se tornar uma escritora conhecida (e lida).
Hilda Hilst conseguiu deixar sua marca, como uma grande escritora. Ainda
que pese o fato de que sua grande exposição tenha ocorrido após a sua morte,
Hilda conseguiu projeção. A escritora foi a homenageada da Feira Literária de
Paraty (Flip) em 2018.
A biografia elaborada por Laura Folgueira e Luisa Destri vem a enaltecer
a importância de Hilda Hilst e ajudar no processo de torná-la ainda mais
conhecida. Mesmo que você não tenha lido nada de Hilda, vale a leitura da
biografia. Nas páginas publicadas pela Tordesilhas você lerá uma grande
história de vida de uma mulher que tinha um projeto e seguiu firme no seu
propósito.
Sobre as autoras:
Laura Folgueira e Luisa Destri | Foto: Daniela Ramiro |
Laura Folgueira é
tradutora e pesquisadora de literatura brasileira. Formada em jornalismo pela
Faculdade Casper Líbero, em 2006, é pós-graduada pela PUC-SP, onde estudou o
livro A Obscena Senhora D, de Hilda Hilst, na monografia intitulada Construção
da Personagem e Derreliação na Linguagem. Em 20178, conclui mestrado em
Lestras, também dedicado a pesquisar a obra de Hilda. Criou o projeto
#KDMulheres, dedicado a promover a visibilidade das mulheres escritoras em
publicações e eventos.
Luisa Destri é pesquisadora, professora e
coautora de Por que ler Hilda Hilst (Globo, 2010) e organizadora da antologia
Uma Superfície de Gelo Ancorada no Riso, com escritos da mesma autora. Autou
como consultora da Ocupação Hilda Hilst, organizada pelo Itaú Cultural em 2015.
Jornalista formada pela Casper Líbero, é mestre em Teoria Literária pela
Unicamp, com a dissertação De Tua Sábia Ausência – A Poesia de Hilda Hilst e a
Tradição Lírica Amorosa (2010), e Doutora em Literatura Brasileira pela USP.
Ficha
Técnica
Título: Eu e Não Outra
Subtítulo: A Vida Intensa de
Hilda Hilst
Escritor: Laura Folgueira e
Luisa Destri
Editora: Tordesilhas
Edição: 1ª
ISBN: 978-85-8419-070-6
Número
de Páginas:
227
Ano: 2018
Assunto: Biografia
Preciso saber mais sobre a vida e a obra dessa mulher
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