Solidão é um tema que permeia a vida do ser
humano. A solidão, na obra objeto da resenha, é apresentada pelo escrever
sozinha na madrugada, pelos ruídos que se ouve advindos de outros apartamentos,
pelo desejo de um escritório em que as coisas permaneçam no lugar “sem que ninguém toque em nada” e
presente em tantos outros aspectos que nos são narrados pela autora.
Eu Sozinha, livro de Marina Colasanti, é o
primeiro da escritora, escrito quando ela tinha vinte e seis anos de idade e
atuava como redatora e cronista do Jornal do Brasil. No prólogo a esta nova
edição, publicada pela Global Editora em 2018, Marina frisa que os textos do
livro não são crônicas, como outrora a crítica definiu, possivelmente pela sua
carreira como cronista. O livro se divide em capítulos pares que falam de
momentos presentes e ímpares que carregam aspectos autobiográficos.
“O que
desejava, através dessa estrutura, era mostrar que a solidão se constrói desde
o início, estejamos ou não acompanhados, e que desde o início nos acompanha.”
A publicação original do livro ocorreu em
1968, ano em que Marina Colasanti conseguiu uma editora que aceitou publicá-lo,
após cinco anos de busca.
A solidão que é o foco da autora está em tudo
que aparece nos textos, que parecem isolados, mas que formam uma unicidade. Dá
a plena convicção de que foi um livro planejado, medido, calculado, com textos
que se encaixam, que se complementam, que se contrapõe e que dão coerência ao
discurso. Não estão ali para contar uma história, mas para tratar de um tema
humano com o olhar aguçado de uma escritora que percebe a solidão presente em
tudo, em todos, em vários e distintos momentos. A solidão está na descrição dos
imóveis (de agora e de outrora), na penumbra de cômodos, na retirada de uma
fotografia, na viagem que segue a determinação do comércio internacional, na
chegada da noite, no sono.
“A luz
artificial, sabe-se, tem muitas vantagens. Dosagem precisa, intensidade
inalterável, temperatura constante. Não se movimenta pelas paredes denunciando
o passar do tempo, não se abafa em
prenúncio de chuva, não sangra ao crepúsculo. Evita assim nos seres
humanos a vaga ansiedade, apelo, desejo de voo diante de um céu aberto. A luz
artificial acende-se ao entrar, apaga-se ao sair. Seu consumo é controlado.”
Os textos de Eu Sozinha são curtos, mas
profundos. Conseguem tocar o leitor e fazer com que pensemos nesse estado de
solidão. A solidão sentida e vivida mesmo quando se está acompanhado. Para
Marina Colasanti, a solidão se transformou em palavras, que viraram frases, que
se transformaram em textos que deram origem a um livro.
A escrita é impecável. Percebemos também um
olhar arguto de quem vê sutilezas e que brilhantemente transpõe para o papel.
Não apenas como uma descrição meramente informativa sobre acontecimentos ou
sensações, mas que vai além disso. Transporta o leitor para dentro do texto,
chamando-o a vivenciar a solidão.
É possível ler o livro num único fôlego. E
não será difícil, pois a forma e o estilo de Marina nos conduzem com fluidez e
encanto.
Marina Colasanti | Foto: Reprodução |
Sobre a
autora:
Marina Colasanti nasceu em Asmara, na
Eritreia, viveu em Trípoli, percorreu a Itália em constantes mudanças e
estabeleceu-se no Brasil, em 1948. Sua carreira literária teve início com o
livro Eu Sozinha, datado de 1968. Tem mais de cinquenta títulos publicados, de
poesia, crônicas e contos para crianças, jovens e adultos. Entre vários
prêmios, ganhou seis Jabutis e o Livro do Ano por Ana Z. aonde vai você?, além
de premiações da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil e da Biblioteca
Nacional. Jornalista, foi publicitária e apresentadora de televisão. Pintora e
gravadora de formação, costuma ilustrar boa parte de seus textos. Ao lado do
ofício que a acompanha desde cedo, Marina dedica-se com esmero à tradução de
obras fundamentais da literatura.
Ficha
Técnica
Título: Eu Sozinha
Escritor: Marina Colasanti
Editora: Global
Edição: 2ª
ISBN: 978-85-260-2392-5
Número
de Páginas:
112
Ano: 2018
Assunto: Literatura
brasileira
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