Você já imaginou a possibilidade de
que o mal esteja presente na vida de uma pessoa, de forma que se apresente
naquilo que, supostamente e culturalmente, seria uma bênção?
Quando o Mal tem Um Nome, de Glau
Kemp, foi lançado em 2017 na Amazon. O livro tem 208 páginas e são nessas
páginas que o leitor conhecerá a história de Marta. Ela é uma mulher que já tendo dois filhos
homens e grávida; deseja agora dar a luz a uma menina. Marta vive na cidade de
Aparecida, no interior de São Paulo, onde a trama se desenrola na década de
1970. Uma cidade tomada pela religiosidade, uma vez que nasceu a partir de um
milagre e que, apesar de cercada de fé e de devoção, pode ver o mal habitar por
ali.
O plano que ela traça para a sua vida,
em sua cabeça, não depende unicamente dela. Alguém pode "escolher" o
sexo do filho, depois de se ver no processo gestacional? Vivendo com um marido
que tem um comportamento machista, ela que anseia pelo nascimento de uma
menina, vai se deparar com uma situação sobrenatural. Se o que ela mais deseja
é uma filha, é com esse intuito que ela busca alguém que possa lhe satisfazer
esse desejo. E Marta parece não ter a noção do que pode acontecer. No entanto,
é a partir de um ritual na qual ela tem contato com o oculto que sua vida muda.
Depois de conhecer a história de
Marta, o leitor passa a acompanhar a vida de Maria Clara. E prepare-se, pois a
vida dessa garota não é nada fácil. Ela não tem uma relação muito
amistosa com seu pai e passa por situações um tanto quanto penosas durante a
trama.
Se o mal tem um nome, ele precisa se
manifestar nas páginas do livro. Calma, caro leitor, pois a presença do mal se manifesta em diversas
cenas. E, com maior ou menor intensidade, traz o terror a quem lê. Vale observar
a tenacidade da autora em usar momentos menos chocantes e outros bastante
impactantes, o que mexe com o leitor, na medida em que é possível acompanhar um
looping de sentimentos ao longo da
leitura.
O mal de fato tem um nome, e ele
ataca, mesmo parecendo um ser de luz, aos olhos de quem não sabe o seu nome. E
ele está presente e atende seu chamado, mesmo quando você não abre a boca para
pronunciar o seu nome. O pensamento o chama.
O mal pode vir até na figura de um
bebê que parece desamparado pela mãe problemática, que advém de uma mãe que
fizera um pacto nefasto e que percebe que as coisas ao redor não são nada boas.
Vários eventos obscuros ocorrem e causam repulsa, pavor e morte. O medo ronda
os personagens e pega os leitores pelas mãos ao conduzi-los por uma trama
envolvente e igualmente apavorante.
E o mal também pode se manifestar no
homem amado, que se transfigura numa imagem de lembrança. O mal. Ele ronda os
personagens, ronda a vida de quem sabendo o que queria, não imaginava o tamanho
da carga que teria de carregar para conseguir o que havia desejado.
"Um corpo sem vida de olhos brilhantes e pequenas veias estouradas.
Um olhar vermelho como todo o sangue cobrindo seu rosto e corpo. A respiração
deficiente e o andar vacilante poderiam convencer qualquer pessoa que se
tratava de um cadáver ambulante. Como todos os recentes acontecimentos
surreais."
Com todos os acontecimentos surreais,
mencionados no trecho acima, o leitor há de perceber que são acontecimentos
sobrenaturais. Se você não acredita, tudo bem. Leia pela trama de terror,
pelo arco dramático vivido pelas personagens, o que, a propósito, é bem
delineado pela autora. E o livro traz figuras femininas que o protagonizam, com
o mal (o maligno) rondando-as.
Marta, a personagem citada no início da resenha, tem uma
obstinação invejável. Seu desejo é tamanho em ter uma menina que ela chega a
negar a realidade, distancia-se do que é tangível para conquistar aquilo que
parece absurdo aos olhos de alguém “comum”. Esse distanciamento e obstinação é
o que a faz procurar a magia para concretizar o seu intento. Seja pelo destino,
ou por forças ocultas, alguns eventos facilitam que ela chegue ao que precisa.
Maria Clara, a outra personagem que
acompanhamos, quando nasce, já dá sinais de que terá uma vida nada fácil. E
assim o é. Um preço alto a se pagar por um desejo que não fora seu. As duas
personagens causam sentimentos controversos no leitor. Ora podemos nos sentir
tocados por suas qualidades e até por frustrações e em momentos que se seguem
podemos mudar o sentimento, dado os atos que elas cometem e as decisões que
tomam. Fogem do arquétipo do maniqueísmo em que é necessário ser só bem ou só
mal. E os personagens criados pela autora se demonstram ao leitor no avançar
das páginas e pelo seu próprio comportamento, mesmo que alguns pontos de suas
ações sejam questionáveis, eles estão lá, escancarando quem são essas pessoas.
O que noto no terror de Glau Kemp é
que há um plano secundário que, se o leitor for além, do que está ali escrito
pode interpretar de uma maneira ímpar. Veja que a obstinada Marta acaba cedendo
o peso de seu desejo a sua filha. É ela quem carrega todo o peso de escolhas
que não foram suas. Quantas não são as pessoas que depositam seus anseios nos
filhos?
Outro ponto é que, sabendo do
mal, quem de fora está e com ele não lida, não consegue percebe-lo. Quantas
vezes você não se surpreende com alguém "acima
de qualquer suspeita" (grifo meu) que comete um ato inimaginável? Não
nos deparamos com alguém que nos deixa boquiaberto diante da crueldade com que é
pratica determinados atos?
E o terror que espreita as
personagens? Não poderiam ser os medos que temos e que nos apavoram, limitam ou
que levam alguns a cometerem atos impensados? Não seriam uma outra visão da
violência e da opressão que paira sobre as duas mulheres? Pois bem, ao leitor
caberá interpretar para além das páginas do livro. O que posso afirmar é que há
uma excelente história de terror nas páginas de Quando o mal tem um nome.
É preciso acrescentar, caro leitor,
que temos aqui um livro forte e que mexe com quem o lê.
Foto: Reprodução |
Sobre a
autora
Glau Kemp reside na praia de Itaipuaçu em
Maricá- RJ, com seus cães e livros. Graduanda de medicina veterinária, gosta de
estar em meio a natureza e animais. Publica de forma independente seus contos e
romances na Amazon, além de participar de diversas antologias em diferentes
editoras. Já flertou com vários gêneros, mas seu trabalho está mais concentrado
no suspense e terror, incluindo a criação e adaptação de contos e romances para
roteiro de quadrinhos. Autora por necessidade da alma é fascinada por mundos
fantásticos e a natureza humana.
Ficha
Técnica
Título: Quando o mal tem um
nome
Escritor: Glau Kemp
Editora: Independente
Edição: 1ª
Número
de Páginas:
174
Ano: 2017
Assunto: Ficção brasileira
Uau... que medooo desse livro!!!! kkkkk
ResponderExcluirÓtima resenha!
Abração,
Drica.