“...
irei viver na quietude, na quietude mais absoluta possível, para que do fundo
de mim mesmo ou do mistério das coisas não provoque a minha ação o aparecimento
de energias estranhas à minha vontade, que mais me façam sofrer e tirem o doce
sabor de viver..,.”
Triste Fim de Policarpo
Quaresma foi publicado primeiramente em folhetim no ano de 1911 e, depois, em
1915, publicado em livro. Do escritor Lima Barreto, li a edição que foi
publicada pela Klick Editora em 1997. A história se passa nos primeiros anos da
República, durante o governo de Floriano Peixoto, que compreendeu os anos de
1891 a 1894.
Narrado em terceira pessoa, o
livro é dividido em três partes. Na primeira temos contato com o Policarpo
Quaresma, mais conhecido por Major Quaresma e focando em sua vida como um
modesto funcionário público, subsecretário do Arsenal de Guerra. Nesta etapa do
livro ele prepara sua reforma cultural. Quaresma é um homem tido em boa conta,
embora não se faça compreender. Interessante observar que o personagem não faz
julgamentos, não assume posições, embora siga com suas ações nacionalistas.
“...
a sua idade, a sua ilustração, a modéstia e honestidade de seu viver
empunham-no respeito de todos.”
Policarpo é solteiro, vive
com sua irmã Adelaide e tem uma biblioteca repleta de livros sobre o Brasil. É
um inveterado patriota que tem obsessão em salvar o país reformando os
costumes. Ele acredita piamente que o país pode ser a grande nação do mundo. O
personagem nacionalista é um tanto quanto ufanista em sua jornada e em relação
a suas crenças.
Lima Barreto escreve que “a convicção que sempre tivera de ser o
Brasil o primeiro país do mundo e o seu grande amor à Pátria, eram agora ativos
e impeliam-no a grandes cometimentos.”
Dado seu patriotismo ele
chega a fazer requerimento para que o tupi-guarani, falado pelos índios, seja
instituída como “língua oficial e nacional do povo brasileiro”. Ele também redige
documentos oficiais em tupi e acaba por ser levado a um sanatório, quando
muitos acreditam que Policarpo flerta com a loucura.
Na segunda parte do livro o
personagem trata de fazer a sua reforma agrícola. Policarpo, depois de sair do
sanatório em que estivera internado, passa a residir no campo, no Sítio do
Sossego. De acordo com a narrativa ele mora ali “não havia três meses”. Passa a plantar, mas não contava Quaresma
com o solo, as saúvas e a política local, que acabam por levá-lo à decepção em
relação a sua pretensa reforma por meio da agricultura.
Na terceira parte da obra
Policarpo Quaresma atua como soldado voluntário na Revolta Armada em 1893, depois
de voltar para a capital Rio de Janeiro.
Suas investidas pelas
reformas pretendidas acabam por demonstrar um país diferente daquele imaginado.
Lima Barreto traçou de forma expressiva uma crítica aquele tipo de idealismo
que não se apraz em constatar a realidade que cerca o idealista. O livro é uma
clara sátira ao Brasil daquela época com tintas fortes nos personagens
funcionários públicos, o que se vê também em general que não tem batalha para
atuar, em almirante destinado a navio nenhum, um major preocupado tão somente
com a legislação que regeria sua aposentadoria. Claramente há uma crítica
política.
Mosaico de capas |
Há elementos daquele tempo
que perduram até hoje, seja por meio dos estereótipos que permanecem na
sociedade e que foram retratados no livro, seja pela forma como Lima Barreto
foi capaz de descrever algo que não sabia que perduraria até os tempos atuais.
O autor faz também a defesa daqueles que são oprimidos, sobretudo quando
Quaresma adota a postura de defender as pessoas contra quem os oprime. Além
disso, o leitor vê em Ricardo Coração de Jesus, um homem de bem que ao lado da
sobrinha do Major Quaresma, acredita nos ideais que ele expressa. No entanto,
Quaresma está cercado de funcionários públicos de moralidade inconsistente.
No que diz respeito a
loucura de Quaresma, o autor fez um personagem emblemático com seus desejos e devaneios,
que vão colocando o leitor em contato com esse aspecto do protagonista que
criou. Policarpo guarda certas semelhanças com o seu criador. Lima Barreto
também foi funcionário público, trabalhou no Ministério da Guerra e foi
internado num hospício.
Policarpo Quaresma, como
alude o título da obra, caminha para seu triste fim na terceira etapa do livro.
Momento em que conclui sobre sua vida, sua luta e seus sonhos.
Lima Barreto era um autor,
cujos romances eram feitos com linguagem dotada de informalidade, diferente do
modo erudito de escrever que era bastante característico do seu tempo. A
linguagem adotada por ele está mais próxima da jornalística e da fala do
dia-a-dia.
Li o livro na adolescência,
no tempo de colégio. Resolvi reler os clássicos da literatura em língua
portuguesa para rememorar. Assim que iniciei a leitura veio-me logo na mente as
lembranças sobre determinadas passagens. Reler depois de certo tempo dá um
outro olhar para a obra, um olhar mais consciente da grandeza do autor e da
criticidade que reverbera na sátira que construiu.
É um ótimo livro. Vale a
pena ler/reler.
Mosaico de capas |
Foto: Reprodução |
Sobre
o autor
Lima Barreto nasceu Afonso Henriques de Lima
Barreto. Era mestiço e de origem humilde. Nasceu no Rio de Janeiro em 1881, fez
parte dos estudos preparatórios no Colégio Pedro II. Ingressou na Escola
Politécnica, que abandonou antes da formatura para assegurar o sustento no
funcionalismo público. Dedicou-se ao jornalismo e à literatura de crítica
social. Seu pai e ele próprio esteve internado em casa de desajustados mentais.
A boêmia e o alcoolismo levaram em sua morte prematura, em 1922, aos 41 anos.
Ficha
Técnica
Título: Triste Fim de
Policarpo Quaresma
Escritor: Lima Barreto
Editora: Klick Editora
Edição: 1ª
Número
de Páginas:
191
Ano: 1997
Assunto: Literatura
brasileira
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