“Quando
eu pensava em ir para casa, ficava sem ar. Minha casa dava mais medo que as
bombas.”
A pequena Ada trava uma
verdadeira batalha em sua casa. De lá a garota não sai e tudo que pode ver do mundo
externo é o que conseguia visualizar a partir de sua janela. A mãe a escondia
pelo simples fato de a menina ter um pé torto.
Em 1939 a Inglaterra estava
à beira de adentrar uma Grande Guerra. Ada já havia ouvido falar de Hitler, mas
ele não era uma preocupação para ela. Suas preocupações eram outras e a menina
vislumbra uma possibilidade de liberdade, de descobrir mais sobre o mundo, quando
crianças partem de Londres em um trem. Ada então tinha dez anos, embora não
soubesse precisar sua idade. Ao lado de
seu irmão Jamie, eles fogem em meio a outras crianças para a área dos evacuados.
“O
trem era horrível, claro. A maioria das crianças não estava tão feliz quanto eu
com a partida. Algumas choravam, e uma vomitou no cantinho do vagão. A
professora encarregada do vagão ia e vinha (...) ela não sabia quanto tempo
faltava, e ninguém nem sabia aonde o trem estava indo, muito menos quanto tempo
levaria para chegar.” Relata Ada, que faz a narrativa do livro
em primeira pessoa.
No lugar para os quais foram
levados eles passam a receber cuidados de Susan Smith, uma mulher que vive de
rendimentos e que se sente só. Cria-se a partir daí uma relação de avesso e
proximidade, de ensinamentos e aprendizados, de segredos e descobertas.
Ada, que sempre via a vida
pela janela, tem agora um mundo a ser descortinado. Até palavras e objetos
tornam-se novidade para a garota. Essa inocência faz com o que o leitor sinta a
sensibilidade da autora em ter criado uma trama que se passa num período de
guerra, mas que não deixa de falar de coisas singelas e que tocam o lado humano
do indivíduo.
A menina criada por Kimberly
é zelosa com seu irmão mais novo, único irmão. Indagadora e curiosa, Ada também
carrega marcas do tempo em que vivera com a mãe. Seu pé feio e torto, sobre o
qual nunca recebera a informação de que poderia ser melhorado, a incomoda. A
possibilidade de que exista correção para sua deformidade mexe com os
sentimentos de Ada.
A guerra acontece. Ela se
safa também da guerra que vivia ao lado de sua mãe com falta de afetividade e
que a tinha como um selo de vergonha, uma menina que precisava ser mantida
longe dos olhares curiosos da sociedade. Ada também começa a ver de perto, com
seu olhar peculiar, as questões que envolvem uma guerra, a guerra da qual seu
país participa.
“Mais
tarde o povo chamou de milagre, mas, no nosso vilarejo, foi um verdadeiro
desastre.”
Enquanto vive com Susan
Smith, Ada e Jamie, tem contato com outras pessoas e animais, como o pônei
Manteiga e o gato Bovril. O primeiro se torna amigo da menina e o segundo se torna xodó do garoto. A
relação que as crianças tem com Susan vai sendo construída no cotidiano, com
paciência, cuidado e rompimento de barreiras. O nó inicial que percebemos vai
se tornando laço.
A Guerra Que Salvou a Minha
Vida, de Kimberly Brubaker Bradley, foi publicado no Brasil
pela DarkSide Books e traduzido por Mariana Serpa Vollmer. O livro é premiado. Ganhou o Newbery Honor Book, o Schneider Family Book
Award e o Jossette Frank Award. A obra também ficou entre os melhores livros do
ano de 2015 pelo Wall Street Journal, a Publishers Weekly, a New York Public
Library e a Chicago Public Library. O livro de Kimberly é
adotado em várias escolas dos Estados Unidos.
Narrado em primeira pessoa,
vemos em Ada uma personagem cativante.
Tem a inocência de sua idade, os sonhos próprios de uma criança e tem de
encarar sua guerra pessoal. Ela demonstra sensibilidade (o que se comprova pela
relação com o irmão), mas também sabe se impor com seu jeito de criança que
“fala sem pensar”. Esperta, atenta, curiosa, ela nos leva à visão de uma
criança sobre a guerra. Presa em seu próprio país dá uma lição sobre
posicionamento diante do mundo para conquistar o seu espaço.
“Existe
guerra de tudo quanto é tipo.”
Não podemos deixar também de
comentar que a história trata de maus tratos de uma mãe. Esta aí um ponto
interessante da abordagem que faz supor que a guerra travada pelos países dá
certo conforto à criança, que sofre com a guerra diária dentro de seu lar.
Requer reflexão do leitor.
Há passagens comoventes no
livro e outras tantas que nos faz sentir a dor da guerra pelo olhar da menina
que quer, antes de mais nada, conquistar o seu lugar no mundo. Trata-se de uma
comovente e encantadora história de superação.
“Vitória
significa paz.”
Foto: Reprodução |
Sobre
a autora
Kimberly Brubaker Bradley nasceu em 1967 em
Indiana, Estados Unidos. Vive com o marido e os filhos em uma fazenda no sopé
das Montanhas Apalaches, entre pôneis, cães, gatos, ovelhas, cabras, e muitas,
muitas árvores. É autora de vários livros, entre eles Leap of Faith e
Jefferson’s Sons.
Ficha
Técnica
Título: A Guerra Que Salvou
A Minha Vida
Escritor: Kimberly
Brubaker Bradley
Editora: DarkSide
Books
Edição: 1ª
ISBN: 978-85-9454-026-3
Número
de Páginas:
240
Ano: 2017
Assunto: Ficção
norte-americana
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